Coluna

Quero viver até lá!

A partir de sua vivência profissional, Fabio Wolff faz uma análise completa do cenário do patrocínio no futebol brasileiro

Quero viver até lá!

15 de agosto de 2018

6 minutos de Leitura

Fábio Wolff
Fábio Wolff
Fábio Wolff é sócio-diretor da Wolff Sports, e professor em cursos de MBA em Gestão e Marketing Esportivo na Trevisan Escola de Negócios

Na semana passada eu estava finalizando a redação de meu novo texto para a essa coluna aqui no MKTEsportivo, intitulado Venderam o Mickey!, quando li o artigo Por que não aqui? Uma análise do patrocínio de camisa dos clubes da América Latina e oportunidade para os clubes brasileiros, escrito pelo amigo e competente profissional Jose Colagrossi (leia o texto aqui). Como o assunto abordado se refere ao dia a dia de nossos negócios na Wolff Sports, resolvi segurar o Mickey um pouco e tomo a liberdade de comentar alguns aspectos do artigo de Colagrossi.

Nos primeiros parágrafos do texto, ele aponta diversos pontos positivos do futebol brasileiro, como calendário atualmente organizado, novas arenas, ampla cobertura da mídia dos principais campeonatos, entre outros. Apesar de listar o que considera bom em nosso futebol, o autor informa, citando recente levantamento do IBOPE Repucom, que nos principais países da América Latina há uma diversidade maior de patrocinadores e também marcas globais mais relevantes que entre os patrocinadores por aqui. E ele lança três perguntas para, então, discorrer em sua análise: “Por que marcas tão importantes no país, como Coca Cola, McDonald’s, Pepsi e Toyota, apenas para citar algumas, investem no futebol de outros países latino-americanos, mas não no Brasil?”, “Por que algumas destas marcas investiram no futebol brasileiro no passado, como Coca Cola, Pepsi, Kia, Samsung e Huawei saíram e nunca mais voltaram?” e “O que o futebol destes países oferece a esses patrocinadores que o nosso futebol não oferece?”.

Colagrossi conta que, após conversar com diversos patrocinadores, são muitos e diversos os motivos para marcas importantes abandonarem seus investimentos em patrocínios ao futebol no Brasil, ou simplesmente não investirem. Entretanto os mais comuns seriam:

  • o legado de arrogância dos gestores do esporte vindo de décadas passadas;
  • a falta de profissionalismo;
  • a inflação no preço dos patrocínios que precedeu 2014;
  • a crise de credibilidade tanto esportiva quanto na gestão do esporte logo após 2014.

 

Nesses 22 anos de mercado, como representante de diversos clientes, já vivenciei muitos momentos de arrogância e falta de profissionalismo por parte de alguns gestores. Foi preciso ter muito jogo de cintura, ser político e ter muita paciência para resolver os estresses gerados e não deixar que, muitas vezes, essas situações chegassem aos clientes. Logicamente, nem sempre isso foi possível, uma vez que em algumas ocasiões os clientes queriam ter contato direto com os clubes.

Em uma ocasião, por exemplo, um clube mandou todas as camisetas que o patrocinador tinha direito diretamente a ele. Até aí, nada de mais, exceto pelo fato de que as mesmas vieram dentro de um saco de lixo, todas tamanho P e no modelo 2 do uniforme (o de menor demanda). Não foi surpresa recebermos na agência o contato do cliente (era uma multinacional) informando para continuarmos focados, mas já avisados de que o patrocínio, mesmo que recém iniciado, não seria renovado. Aliás, é bom destacar que esse cliente nunca mais voltou.

A estrutura dos clubes – leia-se departamento comercial e de marketing – na maioria das vezes é bem menor do que deveria ser. Alguns profissionais são bem preparados, mas a demanda de trabalho que eles tem é absurdamente excessiva. Costumo brincar que é preciso ser um Super Homem ou uma Mulher Maravilha para trabalhar em um clube de futebol. Essa escassez de mão de obra pode impossibilitar o clube de procurar entender melhor quem é o patrocinador, qual a estratégia ao associar a sua marca ao time e como o clube poderá facilitar esse parceiro a atingir seus objetivos de marketing e, com isso, ambos construírem os alicerces de uma parceria de sucesso.

O futebol brasileiro possui alguns casos de sucesso na gestão de clubes, mas o sucesso de hoje não garante o sucesso a médio e longo prazos, ainda mais considerando que a cada 2 ou 3 anos ocorrem eleições nos clubes e tudo pode mudar (ou não) em sua gestão. O que adianta um clube dar 10 passos para a frente com uma boa gestão hoje, se amanhã poderá dar outros 100 para trás com um outro grupo de dirigentes? Eu acredito na profissionalização a longo prazo dos clubes de futebol, mas o melhor é que isso ocorra por meio de entidades com fins lucrativos.

A inflação no preço dos patrocínios que precedeu 2014, na minha opinião, é uma desculpa e não um motivo. Os grandes players do mercado investem centenas de milhões de reais – alguns poucos até bilhões – em marketing, o que não impediria o investimento, por exemplo, de R$ 30 milhões no patrocínio máster do Flamengo ou ao Corinthians (e mais um montante para ativação, é claro!). Se algumas empresas não querem investir no futebol, definitivamente não é essa a desculpa a ser dada.

Aliás, eu acredito em valores de patrocínio aos clubes bem superiores aos atuais, caso o futebol brasileiro fosse profissional. Na agência, nós temos diversos cases bem-sucedidos de branding (com ROI superior a 30x), além de ativação e relacionamento. Diversos patrocínios fechados atualmente são financeiramente iguais ou menores aos da época em questão, e valores de tabela raramente costumam ser os mesmos valores de fechamento de contratos.

A ausência de alguns dos principais players do mercado no rol de patrocinadores ao futebol brasileiro abre a oportunidade para que algumas empresas, às vezes desconhecidas do público em geral, tenham a oportunidade de associar-se aos clubes de futebol, marcas essas que geralmente são amadas por consumidores fiéis.

O futebol, assim como o samba, é e sempre será uma paixão nacional. O mercado está cada vez mais competitivo, as empresas buscam se aproximar de seus clientes e tornarem-se love brands. Mas eu acredito que vai chegar um momento em que os clubes é que escolherão as suas marcas parceiras e não o contrário. Eu tenho que acreditar nisso e, sinceramente, espero que aconteça logo, pois quero ver isso com os meus olhos.

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