A Inglaterra foi o berço do futebol moderno. Importantes clubes tiveram suas origens em fábricas, ferrovias e portos, não só por lá, mas em toda a Europa, tendo sempre como pano de fundo a paixão de seus praticantes pelo novo esporte que surgia.
Famílias que eram donas de empresas fundaram clubes, como o Sochaux FC (Peugeot), na França, em 1928, ou assumiram controle dos mesmos, como nos casos do AC Milan (Pirelli), em 1909, e da Juventus (FIAT), em 1923. O Bayer 04 Leverkusen surgiu de um desejo dos funcionários da farmacêutica Bayer, apoiado pela empresa, que passou a ser dona do clube desde então. Já o Manchester United tem sua origem em 1878, como Newton Health L&YR Football Club, se tornando em 1892 uma empresa limitada que, somente em 1902, a partir da chegada de quatro novos investidores, mudou seu nome e começou sua trajetória esportiva como hoje conhecemos.
O ponto, aqui, é que, desde o nascimento, os clubes europeus recebiam investimentos de famílias, empresários ou empresas, visando o desenvolvimento e crescimento para melhor performance nas diferentes competições.
No Brasil, a história foi um pouco diferente. Os clubes nem sempre nasceram tendo o futebol como principal esporte a ser praticado. Muito por conta do amplo litoral, o remo esteve presente como esporte estatutário em diversos clubes importantes, como o Flamengo, o Botafogo e o Vasco da Gama. A maioria dos times que nasceu no Brasil, entre os séculos XIX e XX, surgiu a partir da união de abnegados desportistas em torno de seus esportes prediletos na forma associativa, quase sempre com recursos doados por cada praticante. À medida que havia a necessidade de novos recursos, novos membros eram admitidos e assim a associação crescia, sempre sem fins lucrativos.
Fiz esta introdução para que todos compreendam as diferenças entre os clubes brasileiros e europeus desde as suas origens, o que acentua a enorme importância da Lei das SAF para o futebol brasileiro, permitindo que times com diferentes histórias e tamanhos possam atrair novos investidores, sejam eles empresários ou fundos de investimento, aumentando assim a capacidade de redução de seu passivo e de investimentos diversos, sempre permeados pela boa gestão & governança.
E por que então uma empresa deveria ser dona de um clube de futebol no Brasil?
Sob o aspecto desportivo financeiro, a aquisição de um clube de futebol pode ser uma excelente oportunidade de negócio, levando em consideração a possibilidade de lucro a partir de linhas de receita diretamente relacionadas à performance técnica dos clubes, tais como direitos de transmissão, formação e negociação de atletas, e premiações, por exemplo.
Não há, sob esta ótica, uma fórmula infalível de sucesso, pois cada clube tem sua realidade e cada negócio depende dos objetivos que se quer atingir. Objetivos e metas devem estar refletidos em seu planejamento estratégico de longo prazo e a governança passa a ser um componente fundamental para o sucesso do empreendimento.
Há também um outro aspecto, tão importante quanto o desportivo financeiro: o comercial e mercadológico. Vivemos a era do marketing digital, com conteúdo e ofertas geradas de forma cada vez mais personalizada. O foco passou a ser não só o cliente, mas a sua rede de conexão que pode ser atingida a partir deste.
Influenciar, engajar, customizar, conectar e tornar o cliente um fiel defensor de sua marca são etapas importantes na construção desta relação. Clientes cada vez mais exigentes, que acessam apenas seus conteúdos prediletos ao seu tempo e hora, mudaram drasticamente o fluxo do marketing e da propaganda. Personas retratam perfis de consumo e podem ser rapidamente redefinidas e criadas a partir dos resultados obtidos com pesquisas e campanhas.
A tecnologia de hoje nos permite criar ecossistemas de relacionamento e consumo com os clientes, sempre de forma inteligente, personalizada, customizável e com custo bem inferior aos padrões de investimento em marketing do início deste século.
Todos os clientes são fãs, mas nem todos os fãs são clientes. Ser dono de um clube de futebol significa ter a oportunidade imediata de se aproximar de milhares de fãs e torcedores, que poderão se transformar não só em clientes fiéis, mas conectá-los ao ecossistema da sua empresa. A partir da estruturação deste ambiente, com inteligência no uso das diferentes soluções tecnológicas, eles podem consumir e se relacionar também com os patrocinadores e outras marcas interessadas em ofertar produtos e serviços.
Imagine conectar diferentes empresas aos fãs de seu clube e engajá-los de forma divertida e inteligente, utilizando o futebol como tema. Isso pode ser feito com premiações inovadoras para incentivar os fãs a participarem cada vez mais, deixando suas informações, gostos e preferências registradas através de pesquisas rápidas on-line, que geram cada vez mais dados interessantes, permitindo uma segmentação mais assertiva em torno de temas relevantes para cada um.
Os valores dos patrocínios e das parcerias comerciais também podem mudar de patamar na medida em que os patrocinadores passam a ter a oportunidade de desenvolver ações de cross marketing com os fãs do clube patrocinado, tendo como elemento principal de contato a paixão de cada torcedor. No esporte e notadamente no Futebol, o CAC (custo de aquisição do consumidor) tende a ser zero!
Se projetarmos esta visão para um futuro próximo, a partir da construção de um big data, implementação de CRM e funil de vendas no futebol, a definição de uma jornada de consumo do torcedor e clubes de futebol serão uma das mais poderosas forças de venda dentro da indústria de entretenimento, podendo ter ramificações no consumo varejista de qualquer país.
Vamos dar um exemplo. Imaginem que uma Rede Farmacêutica decidisse adquirir no Brasil um clube de aproximadamente 10 MM de torcedores. O clube, após se transformar em SAF, passaria a ter a empresa como acionista majoritária e na estruturação da força de marketing e comercial no clube, vislumbraria de cara o enorme potencial de conversão de torcedores em clientes. Para isso, importante investimento em pessoas e soluções de dados, engajamento e vendas seria fundamental.
Os reflexos deste investimento seriam percebidos não só para a própria empresa, na busca de novos clientes e maiores receitas, mas também para o próprio clube, que com esta base rica de clientes, poderia atrair também as empresas parceiras da farmacêutica, interessadas em Share e maiores receitas. Se torna assim um ciclo virtuoso, onde o clube amplia suas receitas, sua capacidade de reinvestir nas áreas fundamentais visando performance e resultados, colhendo frutos de uma boa gestão.
A empresa ganha na distribuição dos lucros do clube assim como na ampliação de sua base de clientes e da fatia de mercado. É o casamento perfeito.
A riqueza de informações em torno dos clientes e a possibilidade de tornar este relacionamento duradouro torna o clube de futebol uma excelente oportunidade para ampliar mercado, conectar marcas e permite a monetização de diferentes relações a serem estabelecidas. É por isso que eu digo e repito: sua empresa deve comprar um time!