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Eduardo Kobra destaca conexão de Ayrton Senna com Deus em mural no GP de Miami da F1

Em entrevista ao MKTEsportivo, artista faz um paralelo de sua vida com a trajetória do piloto e sua contribuição para preservar a memória de Senna de forma tão significativa

Eduardo Kobra destaca conexão de Ayrton Senna com Deus em mural no GP de Miami da F1
Foto: Brian Snyder/REUTERS

03 de maio de 2024

9 minutos de Leitura

Consagrado como um dos maiores expoentes da arte urbana, o artista plástico Eduardo Kobra inaugurou, na quinta-feira (2), um mural dedicado ao legado de 30 anos do Ayrton Senna, no Autódromo de Miami, nos Estados Unidos.

Realizada no Hard Rock Stadium com apoio da Senna Brands, a obra de 8 metros de altura por 11 metros de largura retrata o olhar marcante do piloto brasileiro e o tradicional capacete amarelo, verde e azul. Na arte, Senna aparece com as duas mãos juntas, simbolizando oração e paz.

Nascido na periferia de São Paulo em 1975, Eduardo Kobra alcançou reconhecimento global como um dos artistas mais renomados da atualidade. Sua jornada artística começou como pichador na adolescência. Ao longo dos anos, Kobra desenvolveu seu estilo marcante de muralismo, caracterizado por cores vibrantes e contrastantes, e sua habilidade em retratar personalidades, fatos históricos e questões sociais em murais gigantescos.

Admirador da trajetória do piloto, o artista plástico pintou, em 2015, o seu primeiro grande mural sobre um dos maiores ídolos do Brasil. Localizada na esquina da Avenida Paulista com a Rua da Consolação, em São Paulo, a obra também representa o olhar e capacete emblemático de Senna. A inauguração aconteceu dias antes do Grande Prêmio da Fórmula 1 do Brasil.

Foto: Drone Cyrillo

Nascido na periferia e ciente das adversidades, Eduardo Kobra destaca que a trajetória de Ayrton Senna o fez refletir sobre a sua própria caminhada como artista.

“Eu percebi que, pela minha história, por ter nascido na periferia, precisava de pessoas que mostrassem que era possível acreditar, lutar e se esforçar. Na verdade, pude traçar um paralelo com a minha própria jornada como artista. O Senna buscava constantemente superar os limites dele, alcançar excelência e percebi que, se quisesse alcançar outros patamares, ia ter que continuar a me esforçar dez vezes mais por conta da minha origem. Acredito que muitos desses valores me marcaram como uma tatuagem”, disse Eduardo Kobra, em entrevista exclusiva ao MKTEsportivo.

Para sua primeira obra sobre Senna, o artista teve contato com a família e afirma que ter chamado a atenção deles foi a realização de um sonho.

“Quando comecei a pintar os murais do Senna, acredito que era mais complicado porque pintava por ser apaixonado pela história e pela vida dele. Pintava os murais sem permissão. Tive a primeira oportunidade com o mural da Rua da Consolação, em São Paulo, em um prédio de 40 metros de altura. Encontrei a mãe e outros familiares, e tive acesso ao acervo iconógrafo. Nunca vou me esquecer quando me receberam no Instituto Ayrton Senna. Para mim, era um sonho, porque me imaginava muito pequeno para poder chamar a atenção deles, ter esse carinho e recepção, e perceber que a família estava atenta ao que estava fazendo”, detalhou.

Já para o GP de Ímola, o convite chegou por e-mail e, à exemplo o trabalho realizado no Autódromo de Interlagos em 2020 para celebrar o aniversário de 80 anos do local, o objetivo era que a obra estivesse no grid de largada.

Tive a oportunidade de pintar em Ímola e recebi o convite por e-mail. Eles tinham visto outros murais que pintei. Me surpreendi ao chegar lá no mural, porque é exatamente no grid de largada, exatamente da mesma forma que fiz em Interlagos. Dessa vez, em Miami, aconteceu um fato muito interessante. Fui convidado por outro artista para ter um trabalho. Ele me chamou porque gosta do meu trabalho, viu essa oportunidade e se juntou aos diretores da Fórmula 1 de Miami.

Eduardo Kobra

“Quando foi colocado para o CEO essa possibilidade, ele disse que era fã do Senna, mas também gostava muito da minha obra. Inclusive, ele tem uma obra minha original. Isso foi muito interessante porque conseguimos conectar a Fórmula 1 e a arte. Foi uma visão de vanguarda, no Estádio do Miami Dolphins, que ao redor tem as corridas da categoria”, acrescentou.

Para esta quarta obra, Kobra buscou nos valores de Ayrton Senna e na forte ligação do piloto com Deus sua principal fonte de inspiração.

“Além de ser um homem de determinação, de coragem e muita paixão, ele é um exemplo de integridade, humildade e fé. Foi por meio da fé que eu acredito que ele pôde alcançar degraus mais altos. No novo mural, eu trouxe justamente esse ponto de conexão do Senna com Deus. Ele está em uma posição contemplando os outros pilotos, com as mãos juntas simbolizando a fé”, finalizou.

Confira, na integra, a entrevista de Eduardo Kobra ao MKTEsportivo:

Kobra, qual era sua relação com o Ayrton Senna na infância e adolescência? Assistia as corridas, já tinha uma admiração por ele?

Tive esse privilégio, sim. Lembro de me sentir muito motivado, inspirado e orgulhoso de ser brasileiro, porque o Ayrton saía do Brasil, viajava o mundo inteiro vencendo e levando o nome do país. Lembro de me sentir muito orgulhoso e de perceber o carinho que ele tinha com as pessoas. Acredito que os exemplos que ele deixou, de integridade, generosidade e fé, me inspiraram a perseguir meus sonhos com fervor e dedicação.

Eu percebi que, pela minha história, por ter nascido na periferia, precisava de pessoas que mostrassem que era possível acreditar, lutar e se esforçar. Na verdade, pude traçar um paralelo com a minha própria jornada como artista. O Senna buscava constantemente superar os limites dele, alcançar excelência e percebi que, se quisesse alcançar outros patamares, ia ter que continuar a me esforçar dez vezes mais por conta da minha origem. Acredito que muitos desses valores me marcaram como uma tatuagem.

Indo para a quarta obra sobre o piloto, qual a sua proximidade com o Instituto Senna e a família? Acaba sendo um facilitador no momento da concepção das pinturas?

O Senna deixou um legado e inspiração para gerações. Até hoje as pessoas se emocionam ao ouvir as músicas e ao ver as imagens das corridas que ele ganhou. Tudo isso é muito motivador. Quando comecei a pintar os murais do Senna, acredito que era mais complicado porque pintava por ser apaixonado pela história e pela vida dele. Pintava os murais sem permissão. Tive a primeira oportunidade com o mural da Rua da Consolação, em São Paulo, em um prédio de 40 metros de altura. Encontrei a mãe e outros familiares, e tive acesso ao acervo iconógrafo. Nunca vou me esquecer quando me receberam no Instituto Ayrton Senna. Para mim, era um sonho, porque me imaginava muito pequeno para poder chamar a atenção deles, ter esse carinho e recepção, e perceber que a família estava atenta ao que estava fazendo.

A partir disso, passei a admirar ainda mais a forma que eles trabalham e a seriedade. O Instituto tem pessoas super comprometidas, entregando um trabalho excepcional e transformando vidas mesmo por meio da história do Senna. Então, tudo isso me ajudou e eu percebi que era o caminho certo, que realmente por meio do exemplo da vida dele, a gente pode tocar outras vidas. Tanta gente simples que jamais teve a oportunidade de ir a um Grande Prêmio da Fórmula 1, mas acordava todo domingo cedo para ver as corridas do Senna, justamente porque se conectavam primeiro com ele. Isso é um espetáculo.

Foto: Felipe del Valle

A F1 cresce rapidamente nos Estados Unidos e se destaca a cada temporada. Como chegou este convite para colocar, mais uma vez, o Ayrton em destaque em um Grande Prêmio?

Tive a oportunidade de pintar em Ímola e recebi o convite por e-mail. Eles tinham visto outros murais que pintei. Me surpreendi ao chegar lá no mural, porque é exatamente no grid de largada, exatamente da mesma forma que fiz em Interlagos. Dessa vez, em Miami, aconteceu um fato muito interessante. Fui convidado por outro artista para ter um trabalho. Ele me chamou porque gosta do meu trabalho, viu essa oportunidade e se juntou aos diretores da Fórmula 1 de Miami.

Quando foi colocado para o CEO essa possibilidade, ele disse que era fã do Senna, mas também gostava muito da minha obra. Inclusive, ele tem uma obra minha original. Isso foi muito interessante porque conseguimos conectar a Fórmula 1 e a arte. Foi uma visão de vanguarda, no Estádio do Miami Dolphins, que ao redor tem as corridas da Fórmula 1. Eu pude, mais uma vez, ocupar essa parede na torre de controle, paralela também ao grid, onde todos os carros entram para os boxes. Também tive a oportunidade de trazer algumas telas para expor no Paddock Premium Club, no Autódromo de Miami, sobre a história do Senna.

Fiz uma imersão sobre a trajetória dele. Para mim, foi um presente muito grande poder ter o meu trabalho em um local tão importante, trazendo a história de um herói brasileiro que é o Senna.

O que cada arte de Ayrton Senna com a sua assinatura representa pra você? Como foi o processo de escolha do que seria retratado?

Eu sempre busco algo além da pintura, da estética, da perspectiva, da luz, sombra e cor. Sou muito dedicado, detalhista e esforçado nesse sentido de buscar sempre uma superação. Temos que lembrar que as criações dependem muito do formato do local. A criação é personalíssima mesmo. Às vezes, você tem uma porta ou uma janela atrapalhando, às vezes é horizontal ou vertical. Então, eu vou adaptando e chego a criar até 20 ou 30 artes diferentes para cada parede.

Por exemplo, o mural em Interlagos está em uma esquina e eu transformei os dois lados dessa quina como se fosse uma caixa de acrílico em que dentro temos o Ayrton Senna em uma das cenas mais heroicas dele – a que ganhou a corrida no Brasil com o carro quebrado e está levantando a taça naquela expressão de sofrimento. Eu quis trazer a memória desse momento. E já tive outros murais também, como é o caso do mural de São Paulo que está em um prédio. Ali, eu quis buscar a força do olhar do Senna, sempre muito concentrado e pensativo. E o resultado desse olhar para os nossos corações.

Nesse mural, eu faço um paralelo. É uma coisa muito pessoal mesmo do Senna, mas que também consigo traçar um paralelo com a minha própria vida. Foram nos momentos mais difíceis para mim que a fé me ajudou, e o Senna demonstra isso. Eu já vi fotos dele em posição de oração antes de uma corrida. Ele disse que Deus estava com ele. Na própria lápide dele tem uma frase que me tocou muito, que é ‘Nada me separará do amor de Deus’. Além de ser um homem de determinação, de coragem e muita paixão, ele é um exemplo de integridade, humildade e fé. Foi por meio da fé que eu acredito que ele pôde alcançar degraus mais altos.

No novo mural, eu trouxe justamente esse ponto de conexão do Senna com Deus. Ele está em uma posição contemplando os outros pilotos, com as mãos juntas simbolizando a fé.

Foto: Brian Snyder/REUTERS
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