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Sucesso do MLB Opening Day traz lições ao calendário do futebol brasileiro

Sucesso do início da temporada da maior liga de baseball do mundo evidencia a importância de uma melhor organização do calendário do futebol brasileiro

Sucesso do MLB Opening Day traz lições ao calendário do futebol brasileiro

10 de abril de 2024

6 minutos de Leitura

Marcelo Loureiro
Marcelo Loureiro
Mestre e doutorando em Gestão Esportiva pela Florida State University

Durante a última semana de abril, o esporte nos Estados Unidos viveu um dos momentos mais importantes em seu calendário: celebrado por fãs de baseball nos Estados Unidos quase como um feriado esportivo nacional, o Opening Day da Major League Baseball marca a abertura oficial da temporada de uma das três principais ligas esportivas do país, ao lado da NFL e da NBA.

Encerrando um hiato de aproximadamente cinco meses sem baseball profissional no país, a data dá início a uma maratona de quase 2.500 jogos que levará à World Series, como é chamada a final da competição, no final de outubro.

No caso da MLB, ainda que cada uma das 30 franquias da maior liga de baseball do mundo jogue 162 partidas durante a temporada regular, o calendário da liga não se estende ao longo de um ano inteiro, ficando restrito a menos de 60% do ano. De forma similar, a NBA distribui seus 82 jogos de temporada regular de outubro a abril, com os playoffs se encerrando em meados de junho, em um calendário bastante parecido com o da NHL, quarta liga mais importante da América do Norte. A NFL, de maneira ainda mais concisa, estende seu período de jogos por cerca de quatro meses apenas, com um mês adicional dedicado aos playoffs, evidenciando uma tendência por parte dos americanos de manter suas competições enxutas.

A excitação vivida pelos americanos com a volta da MLB, nesse sentido traz duas importantes lições ao futebol brasileiro, em minha visão. A primeira dessas lições diz respeito à escassez artificial do esporte enquanto produto, enquanto a segunda está relacionada à organização do calendário esportivo, algo que os americanos fazem com excelência.

Com relação à agenda das ligas norte-americanas, existe uma preocupação clara em tornar cada momento da temporada muito bem definido. Períodos de abertura de janelas de transferências, drafts, divulgação de calendários, início de treinamentos, entre outros, são minuciosamente trabalhados de forma a fazer com que os fãs naveguem as mais diversas etapas que levam ao período de competições, de fato. Dessa forma, existe um esforço planejado para que, mesmo durante os períodos sem jogos, os torcedores não sejam tomados por uma sensação de tédio ou monotonia ao longo do calendário.

Se olharmos para ligas de futebol na Europa, veremos esforços similares nesse sentido, ainda que em menor grau. Períodos de transferências nas ligas europeias são muito bem definidos, por exemplo, com o fechamento da janela sendo um dia de intensa cobertura por parte da imprensa, principalmente na Premier League. Sorteios de chaveamentos e jogos de abertura e encerramento das temporadas também são trabalhados com enorme competência no futebol europeu. Tudo isso com calendários, à moda americana, significativamente mais curtos do que o do futebol brasileiro. O período de férias do futebol inglês, nesse sentido, se aproxima de três meses por ano.

Essa questão nos leva ao segundo ponto, relacionado à escassez do esporte enquanto produto. Mantendo a Inglaterra em mente, o calendário esportivo sempre se conclui com as copas sendo decididas. A FA Cup, assim, é sempre o último jogo da temporada inglesa, sendo seguida apenas pela decisão da Champions League, que vez ou outra contempla alguma equipe do país. Dessa forma, o cronograma de competições é desenhado de forma a sempre se encerrar com a emoção atingindo seu auge, definindo os campeões de todas as competições mais importantes do calendário em um espaço de poucas semanas que resulta no encerramento das competições. No caso da MLB, essa relação é ainda mais evidente, com o vencedor da única competição disputada pelas franquias sendo coroado no último jogo.

Esse encerramento, então, leva a um período em que o torcedor passa a viver a preparação para uma nova temporada, sendo alimentado com a esperança de que o ano seguinte seja vitorioso. Nos Estados Unidos de maneira mais evidente, mas também em ligas europeias de futebol, os períodos de transferência são feitos sob grande atenção por parte dos fãs, praticamente sem se confundir com o período de jogos. Divulgação de calendários e sorteios de chaveamentos também alimentam os fãs a seu próprio tempo, sendo trabalhados como produtos fundamentais para o todo que contempla uma temporada, havendo menos confusão ou luta por espaço com as próprias partidas sendo disputadas.

Esse período apresenta algo fundamental do ponto de vista do engajamento de torcedores, que é a propriedade de gerar saudades e ansiedade, algo em que o futebol brasileiro peca bastante. O Opening Day da MLB, nos Estados Unidos, ou a Community Shield (a Supercopa da Inglaterra), na Europa, são ótimos exemplos de como essa saudade alimentada por meses resulta em um início empolgante para a temporada seguinte, engajando torcedores das mais diversas equipes para o início de um novo período de competições.

Em contrapartida, a falta de interesse normalmente observada pela Supercopa do Brasil, desenhada com o mesmo propósito, me parece ser o exemplo mais claro de que o futebol brasileiro ainda não encontrou uma boa saída para cativar o público geral com seu calendário. Por mais estranha que essa ideia possa parecer, a competição não empolga e não engaja porque o futebol nacional falha em deixar seu torcedor sentir saudades.

As temporadas se conectam de forma quase automática, com o final do Brasileiro representando o início de um intervalo de poucas semanas até o início das disputas do ano seguinte. A Supercopa, então, desenhada para ser uma cerimônia de inauguração de um novo período de competições, abre espaço para uma série de partidas desinteressantes dos campeonatos estaduais. No meio disso tudo, finais de copas se perdem em meio ao calendário, que termina em dezembro com um final melancólico para boa parte dos times, que já não brigam por mais nada. Esses times, então, lutam contra o tempo para iniciar uma preparação minimamente decente para as novas competições, que batem desesperadamente à porta. Em meio a tudo isso, períodos de negociações e divulgações de calendários de jogos se confundem com os próprios jogos, que ocorrem de maneira atropelada ao longo de praticamente onze meses do ano.

Preparar um bom calendário, nesse sentido, é a arte de orquestrar as diferentes emoções do público ao longo de um ano, culminando em um final apoteótico que abre espaço para a saudade e a ansiedade por uma nova temporada. Cada detalhe do calendário é pensado com calma, trabalhando sem pressa as emoções de um torcedor que consegue apreciar ao seu tempo todas as fases que resultam em um ano inteiro de atividades relacionadas a seu time, dentro e fora de campo.

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